A
Casa de Jose Cidrão: eis um conto que me persegue há bastante
tempo. Desde quando passei a conviver com Lúcia e a minha vida
começou a girar em nova rotação. Depois vieram as luzes e os
prazeres, o sol nascendo diferente em cada manhã e o tempo das
sementes se transformando em tempos de colheita.
Os sinos resistiram na imaginação, foram
alimentados pela cozinha de Dona Adi Cidrão, e pelo partido de
gansos a desfilar na lagoa de Marrecas, eternizando as lembranças
que nos levam serenos pela vida.
As torres da Igrejinha de Jesus, Maria e José, as
águas do Puiu onde passei a lavar a minha alma, o mugido das reses
no cercado e as cadeiras na calçada do seu Zé a contemplar as
nuvens mais belas do planeta.
José Castelo Cidrão (Dedé) e Maria José Carvalho
Cidrão (Adi) fundaram a República de Marrecas, e há um século aí
começaram a reinar. Os filhos do casal cresceram respirando o
mormaço da terra, contemplando as flores da buganvília e do
mata-pasto e ouvindo o coaxar dos sapos.
Seu Zé trocou a sua condição de vaqueiro pela
profissão de agrimensor e de perito, pendurando o passado nos
alforjes depois que o legendário Wicca o levou para demarcar as suas
terras, tornando-se seu Zé, com o tempo, o maior viajante do sertão.
E depois vieram os ventos que o transformaram em
chefe de polícia, e líder do partido do governo quando o distrito
de Marrecas conquistou a sua independência, e ali foi erguido um
monumento à tradição da família Carcará.
E de forma que a Casa de seu Zé se tornou a mais
acolhedora de todas as casas do Nordeste. É arejada e rodeada de
alpendres onde se cultiva a boa convivência. É cravejada de
armadores que dançam todas as cirandas e solfejos do sertão.
Na casa do seu Zé Cidrão, as Ladainhas e as Novenas
de Natal e os Ofícios da Sagrada Família são tecidos em louvor de
Dona Adi Cidrão e se bastam ao coração de todos os ouvintes.
Uma santa Dona Adi Cidrão, a filha de seu Né
Parmênio, porque santificado o seu silêncio, porque glorificado o
seu nome por todos os membros da família. Em Dona Adi está a raiz
do seu Zé, e nos filhos do casal estão os ramos de uma árvore que
resiste ao furor das intempéries.
Seu Zé Cidrão das Marrecas, o filho de Laura e de
Francisco Cidrão, o imperador das terras do sem fim, o agrimensor e
o perito, o topógrafo e o cidadão que representa melhor os
Carcarás.
Dito Por Dito, Légua Por Légua, No Sertão dos
Inhamuns: eis a engenharia maior da Casa do
seu Zé, o fio condutor da sua narrativa e a música que se ouve da
forma mais sentida em todo o Ceará.
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