Em
debates dos quais participei no período da vacante sede papal, iniciada com a
renúncia do então Papa Bento XVI (agora Papa Emérito), repeti à saciedade que a
Igreja Católica Apostólica Romana não deve jamais ser analisada com o olhar das
categorias filosóficas expressas na dialética marxista. A Igreja, instituição
formada por seres humanos falíveis tem, no entanto, uma origem divina, que só o
dado da fé consegue prover a sustentabilidade para o entendimento das ações
formuladas no plano eclesial, ditadas pela inspiração do Espírito Santo.
Por
esses dias em que a Igreja Católica mobilizou-se em todo o mundo, em orações,
com vistas a que o Espírito Santo iluminasse o Colégio Cardinalício para a
escolha do Sumo Pontífice, eis que um séquito de personalidades desvestidas de
qualquer ligação com a eclesiologia romano-católica, muitos analistas dos quais
sequer professando uma religião, intentaram determinar o como deveria ser ou
não ser o caminho mais correto para a Igreja. Ora, se não lhes assiste sequer o
mais elementar conhecimento da matéria em discussão, mais ainda falece-lhes a
legitimidade para a indevida intromissão.
Ademais
disto, a Igreja Católica, nas suas principais decisões, como é o caso da
eleição de um Sumo Pontífice, não se pautará jamais pelo olhar profano,
temporal, porque ela não é uma multinacional. Assim o reafirmou o Papa
Francisco na homilia proferida por ocasião da primeira Missa que celebrou como
líder maior da Igreja. Com a proficiência e discernimento que dele já
esperávamos, o Santo Padre, Papa Francisco, lecionou peremptoriamente que sem a
confissão do mistério do Deus encarnado, do nome de Jesus Cristo crucificado, a
Igreja se tornaria tão-somente uma ONG piedosa.
É, destarte, esta confissão decisiva para a substância da fé, inequívoca
para o cristão, que torna a Igreja uma instituição diferente, sempre renovada,
mas assentada na tradição dos Apóstolos e mártires. De modo que para alcançar
as multidões, como se viu nos dias recentes, o Papa não precisa ser pop como
quer o mundo, porque “o mundo jaz no maligno”.
Mas, afinal de contas, o que é ser Papa?
Nas conversas que teve com o jornalista e
vaticanista Vittorio Messori, publicadas em língua vernácula em livro sob o
título “Cruzando o Limiar da Esperança”, o Beato João Paulo II diz que ser Papa
constitui a um tempo um escândalo e um mistério. A metáfora proferida por um
dos mais importantes Pontífices da Igreja Católica, coaduna-se com a Palavra do
Apóstolo Paulo, quando afirma que “nós pregamos o Cristo crucificado, escândalo para os judeus e
loucura para os pagãos”.(I Coríntios, 1,23).
Com efeito, ser Papa nos dias hodiernos constitui a maior
loucura em face do mundo desagregado por ideologias malsãs e impenitentes
inimigos da Igreja, os quais, travestidos de cordeirinhos, imiscuem-se nas
instituições da sociedade e no próprio Corpo de Cristo, com o fito de miná-los,
carcomê-los, destruí-los por dentro. Assim tem sido a ação nefasta e deletéria,
sobretudo para a juventude, do marxismo (hoje com outras vestimentas) e de
pensamentos como a Teologia da Libertação, nascida no ventre da própria Igreja
cristã, mas embalada pela dialética marxista.
Ser Papa é confessar ao mundo que Cristo é o Filho do Deus vivo, como fez Pedro, o primeiro da Sé Apostólica. E, como assevera João Paulo II, “tendo isto como pano de fundo, um pano de fundo histórico, pouco importam expressões como Sumo Pontífice, Vossa Santidade, Santo Padre. Importa o que provém da Morte e Ressurreição de Cristo. É importante o que provém do poder do Espírito Santo”, exatamente porque, consoante a mensagem evangélica, “A linguagem da cruz é loucura para os que se perdem, mas, para os que foram salvos, para nós, é uma força divina". (I Coríntios, 1,18).
O Papa Francisco, na sábia mensagem inicial como Pontífice, deseja que reafirmemos o “escândalo” e o “mistério” que são os Evangelhos, de cuja mensagem ele, o Pontifex Maximus, sucessor de Pedro, é o principal vocacionado para disseminá-la por todo o mundo. Sem esquecer o compromisso da Cristandade, uma vez que, como afirmava-se já ao tempo dos Padres Apostólicos, nos começos do Cristianismo, “Christianus alter Christus”, ou seja, o cristão é um segundo Cristo. O Papa Seu representante na Terra.
Portanto, diante da indiferença religiosa ditada pela pós-modernidade nesta “sociedade líquida” (Zgmunt Baumann), em que as efemeridades preconizam a morte das tradições mais caras à humanidade, como aquelas depositárias da fé católica; e em face das incompreensões de uma sociedade alheia à Transcendência, cega aos fatos apocalípticos e surda ao chamamento profético da Igreja, cumpre lembrar a todos que o titular do Pontificado romano-católico, o Vigário de Cristo, é bem mais do que uma dignidade, como lembra o Beato João Paulo II; mas, constitui, sobretudo e principalmente, um serviço. Enfim, o ministério petrino tem como fim o bem da Igreja e dos fiéis.
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